Há três anos, a Comarca de Comodoro, a 644 km a oeste de Cuiabá, desenvolve um trabalho inovador com os homens acusados de praticar violência doméstica contra as companheiras, o que tem contribuído para a pacificação social da comunidade. Ao analisar o pedido de medida protetiva, o juiz titular da Primeira Vara, Marcelo Sousa Melo Bento de Resende, inclui uma nova condição para o agressor não ser preso: frequentar semanalmente, por dois meses, o programa “Maria da Penha”.
A iniciativa consiste em um grupo reflexivo, que se reúne para conversar mais a fundo sobre o que pode ter motivado as agressões. “Nesses encontros, ao longo de dois meses, são realizadas rodas de conversa, com psicólogo, assistente social e voluntários da área religiosa, como pastores. Um ouve a fala do outro. Percebe-se, em muitos casos, a base de uma formação machista e também muitos casos de alcoolismo. Há excesso do consumo de bebida alcoólica e o município consegue encaminhar alguns desses agressores para tratamento”, explicou o magistrado.
O grupo reflexivo teve início em 29 de abril de 2016. A cada três meses, o juiz Marcelo Resende faz uma audiência de justificação. “A psicóloga informa aqueles que não compareceram e explico que os chamei para dar um aviso: ou participam do projeto ou não terão uma segunda audiência, pois irão para a prisão. Nesses três anos nunca precisei pedir a prisão de nenhum”, destaca.
Ao todo, a iniciativa contabiliza 101 atendimentos em Comodoro, sem contar os municípios de Nova Lacerda e Campos de Júlio, que também possuem grupos reflexivos.
Outro reflexo positivo do projeto é uma melhor efetividade da Patrulha Maria da Penha, que garante a efetividade do cumprimento e fiscalização das medidas protetivas. “Como os agressores vão às reuniões, conseguimos identificar os mais agressivos, aqueles com sentimento de vingança ou rejeição. Esses nomes são encaminhados para a Polícia Militar para que seja feita a patrulha. Atualmente, são seis casos assim, dentre os quais de uma idosa de 70 anos vítima de agressão dos três filhos alcoólatras. Derivou do grupo reflexivo a Patrulha Maria da Penha de maior qualidade”, observa o juiz.
Conforme o magistrado, em Comodoro o grupo já está amplamente divulgado e até mesmo agressores que moram na zona rural participam da iniciativa, mesmo que quinzenalmente, num total de quatro encontros.
“O mais interessante é que a psicóloga fala que muitos agradecem e pedem curso também para as vítimas”, complementa o magistrado.
Segundo a psicóloga Andréia Regina Piovezan Rocha, nas reuniões, realizadas no Centro de Referência de Assistência Social (Cras), participam de 12 a 15 pessoas. O grupo reflexivo se reúne toda sexta-feira, das 10h às 12.
“No começo, vão chateados. Quando percebem que é um espaço que têm para refletir, falar sobre a situação que levou até a medida protetiva, vão vendo que não é um lugar que vai punir, então vão fazendo adesão ao grupo. E é muito bacana, completou três anos e já atendemos mais de 100 agressores”, explica.
Andréia destaca que os grupos reflexivos trazem resultados muito positivos.
“Levo um tema gerador e só faço a medição. Eles mesmos vão dando as sugestões e fazendo a reflexão. Um dá uma solução para o outro e chegam a conclusões sobre aquela situação. Também explicamos a Lei Maria da Penha de forma que entendam. Vão se familiarizando com a situação e terminam até querendo permanecer no grupo depois. Há uma mudança de comportamento muito significativa. Houve um avanço considerável e foi muito importante essa iniciativa do doutor Marcelo. Gosto muito desse trabalho e já conseguimos ver o resultado”, finaliza a psicóloga.